Entre loja, salão de jogos, cafeteria e editora, a empresa Jambô busca proporcionar ao seu público uma experiência única em cada visita. Foto: Guilherme Wunder |
Para quem mora em Porto Alegre e passa pela rua Sarmento Leite, no centro da capital, fica difícil não avistar a loja Nerdz, que chama a atenção de quem passa pela sua arquitetura, que lembra os castelos medievais, e também pelo movimento constante do estabelecimento. E foi buscando conhecer um pouco do encanto que a Nerdz tem que fui até lá, para conhecer a empresa Jambô, conhecida pela linha de RPG Tormenta.
Em um bate-papo na cafeteria da loja Nerdz, Guilherme Dei Svaldi nos apresentou toda a história da marca Jambô, desde o seu início, no começo dos anos 90, até o que a empresa se tornou hoje. Enquanto conversamos, o proprietário da empresa conta que tudo começou como algo mais familiar e de nicho, mas que hoje esse é o sustento de todos, pois a crise não afetou tanto o número das vendas da loja, mas sim a publicação de novos trabalhos. “Nossa média de crescimento nos últimos cinco anos foi de 30%, isso tirando os descontos da inflação. Isso mostra como estamos crescendo e nos consolidando nesse mercado”, ressalta Guilherme.
A prova de que esse retorno está acontecendo é que não faltam projetos para o próximo ano, planos esses que vão desde novas publicações até a prospecção de novos empreendimentos pelo estado. “Nosso objetivo é trazer mais quadrinhos de fora do país, mas sem prejudicar a produção nacional. Atualmente nós estamos trabalhando em um livro de RPG, que é o livro básico do Dragon Age, que é uma franquia bem famosa para os videogames”, disse Svaldi.
A Jambô foi fundada pelo Jadir Dei Svaldi, 70 anos, na rua Coronel Genuíno, nº 209 e, posteriormente, foram para o atual endereço. Desde então o primeiro local onde o comércio foi construído, foi reformado e se transformou no salão de jogos da Jambô. Atualmente todo o empreendimento é administrado pelos irmão Guilherme e Rafael Dei Svaldi, de 32 e 40 anos, respectivamente.
Segundo Guilherme, assumir os negócios do pai, ao lado do seu irmão, não foi uma tarefa tão difícil. Isso se deu por dois motivos: a estabilidade que a empresa já tinha e a paixão dos irmãos pela cultura pop. “Nós sempre gostamos desse mundo, mesmo antes de trabalhar com quadrinhos e jogos de RPG, pois nós também somos consumidores desse mercado. Quando começamos a trabalhar na Jambô a nossa ideia era se especializar em conteúdos voltados para esse nicho”.
Para quem ainda não se familiarizou e estranhou o nome Nerdz, a explicação é bem simples. Conforme Guilherme destacou, em 2002 foi fundada a editora Jambô, que dividia o mesmo nome da loja. Na época foi interessante ter a mesma marca em todas as mídias. Mas uma decisão, em 2015, fez com que um novo conceito fosse constituído, pois “não fazia mais sentido ter a loja e a editora com a mesma marca, então alteramos o nome da loja para Nerdz”.
Outro ponto interessante levantado pelo gaúcho foi a evolução do público que frequenta o estabelecimento ao longo dos anos. Segundo Guilherme, a popularização da cultura nerd fez com que o público se rejuvenescesse e que surgisse novos leitores e curiosos em busca de algo mais sobre o seu herói preferido no cinema. Além disso, o crescimento do público feminino também se destacou. “Acho que 90% das pessoas que frequentavam a Jambô eram do sexo masculino. Isso mudou muito atualmente, onde a quantidade de mulheres é de 40%, chegando a ser 50% em alguns meses”, relata o proprietário.
A crise econômica
Como já é de conhecimento do grande público, tanto o estado do Rio Grande do Sul quanto o Brasil, estão passando por uma de suas maiores (se não a maior) crises financeiras. Com isso, diversas empresas vem perdendo dinheiro e até fechando os seus estabelecimentos. E isso se destaca nos mais diversos ramos de atuação. Só que, apesar dessa realidade estar presente na vida de todos os brasileiros, os clientes da Jambô/Nerdz podem ficar tranquilos, porque a empresa segue em uma crescente no cenário de RPGs e quadrinhos.
Um dos pontos curiosos é que, apesar da situação em que a economia brasileira se encontra atualmente, a empresa continua crescendo e se consolidando no mercado. Para o gaúcho, as pessoas diminuíram sim a frequência e a quantidade de produtos adquiridos, mas não abandonaram em definitivo a compra desse conteúdo. “Isso foi possível ver em alguns dos nossos clientes, que diminuíram a frequência com que vinham aqui e compravam produtos, mas não deixaram de consumir”, comenta.
A editora como uma ramificação da empresa
Em 2002 surge a editora Jambô, que tinha o objetivo de publicar materiais destinados ao fã de RPG que, muitas vezes, acabavam não conhecendo muitos dos jogos que estavam sendo lançados no exterior. “Existiam dezenas de editoras e diversas linhas de RPG sendo lançados nos EUA, enquanto no Brasil existiam apenas duas editoras e pouquíssimo material sendo publicados”, salienta Guilherme.
Mas o que surgiu como uma ferramenta para trazer conteúdo do exterior que não era de conhecimento do grande público brasileiro acabou se tornando uma das maiores editoras do ramo no mercado. A linha Tormenta, considerado o RPG mais jogado no Brasil atualmente, que foi a primeira publicação nacional da editora. O sucesso do jogo foi tão grande que ele acabou sendo adaptado para os games, através do crowdfunding, aonde arrecadou mais de 70 mil reais.
Guilherme Dei Svaldi, editor-chefe da Jambô com livro de RPG e game do universo Tormenta. Foto: Júlio Cordeiro |
Com isso foi possível ver que o cenário nacional também tem muito conteúdo de qualidade e, conforme Guilherme, que além de fundador também é editor-chefe da Jambô, hoje o cenário é diferente e o material brasileiro tem lugar de destaque na editora. “Hoje o cenário é outro e o nosso ramo se inverteu pois, atualmente, nossa linha nacional é maior do que a vinda do exterior, conta.
Atualmente a editora também publica histórias em quadrinhos, que é outro ramo editorial que vem crescendo muito depois da popularização do gênero, graças ao cinema, que vem adaptando grandes histórias para as telonas. Guilherme destaca que, com as HQs, o caminho foi inverso ao do RPG e foi o mercado nacional que acabou sendo o alvo do investimento da Jambô. Segundo o editor-chefe, o quadrinho nacional é visto com certo preconceito pelo público, que acaba consumindo apenas material de fora do país.
“Isso é reflexo da cultura dos brasileiros, que tem aquela “síndrome de vira-lata”, que basta saber que o produto é importado que ele já ganha um ponto, como se isso contasse como avaliação de um trabalho. Isso já acontecia no RPG, mas nos quadrinhos é mais grave ainda. Existem grandes nomes de quadrinistas brasileiros, que são famosos lá fora e não conseguem publicar nada no Brasil, porque não tem quem compre os materiais aqui no seu país de origem”, ressalta Guilherme.
Na área dos quadrinhos o investimento deve aumentar para o próximo ano e lançamentos devem surgir em breve. Para isso, a Jambô contratou o editor Rogério Saladino, autor de Tormenta e ex-editor da Panini Comics, aonde teve a experiência de trabalhar nas histórias em diversos títulos da Marvel Comics, como Homem-Aranha, Wolverine, X-Men, UItimate Marvel e Deadpool. O novo editor da Jambô volta a trabalhar para a editora gaúcha em um novo projeto de expansão da marca.
“A Jambô pretende ampliar sua linha de quadrinhos, sejam nacionais ou estrangeiros, e estava procurando alguém com experiência na área e que eles pudessem confiar, que já conhecessem o estilo de trabalho. O trabalho de editor na Panini é incrível e a realização de um sonho, mas a oportunidade de ter mais liberdade ao publicar livros e quadrinhos acabou falando mais alto. Pra mim, agora, eu prefiro estar na Jambô, ter uma atuação maior e mais presente nas decisões sobre os livros, quadrinhos e similares“, salienta Saladino.
Para Rogério Saladino, a editora Jambô vem crescendo muito no mercado, sendo considerada por alguns como uma das mais importantes do Brasil e, esse também foi um dos motivos para que o editor aceitasse voltar a trabalhar na editora porto-alegrense. “Hoje, a Jambô é uma das grandes editoras dedicadas a fantasia e ficção no Brasil. Uma peça fundamental no cenário atual do RPG, tremendamente importante na literatura fantástica e que, mesmo depois de tudo isso, ainda vai crescer muito mais”.
Enquanto clientes entravam e saiam do estabelecimento, foi possível compreender um pouco qual era a grande pretensão da família Dei Svaldi em começar uma loja que atendesse ao público que consumia RPGs, quadrinhos e livros de fantasia: consolidar no mercado uma empresa familiar e pop.
Guilherme Wunder
Guilherme Wunder
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